6 de dezembro de 2015

Às flores

Nos chamam de flor
Esse povo que desconheço a cultura
Cuja tal brutalidade
Distorcem a igualdade

Acabamos nos tornando
As flores que querem
Pois é difícil se olhar em um espelho que dita as regras de corpo que ainda seguem

Cheiram do meu perfume
esse povo que me tortura
Não vêem minha dor
E de tantas outras, com o sangue de amor

Arrancaram-me as pétalas. 
Assim, não se vê mais as flores

A cultura grita por auxílio 
Mas não enxergam por trás da muralha que construíram 

As lembranças não são guardadas em palavras 
São memórias amontoadas que tentamos disfarçar. 
Os sorrisos mentem, com medo das consequências

Sonhos se tornam de mentira
E a cada dia, nos inventam outro nome
A lua sempre tem minha companhia, 
Nestas noites não há onde se esconder
A janela aberta deixa entrar a ventania 
que traz folhas, lágrimas e gritos

A salvação já não tem como nos regar 
Sem um passo poder dar
Não tem voz 
Ou tempo pra sonhar
Em um mundo onde as flores
Multicolores dançam 
Longe de dores
Da muralha 
Da cultura estimulada
Que não parou por nada

Se às elas perguntar,
Entre águas irão lembrar os amores 
Que se foram em vão
Num povo sem se quer coração
E não voltarão a se calar
se alguém as libertar

Flores de dentro devem gritar, 
E as outras, avançar e seguir. 
Podemos cantar 
Para não desistir

Não mais se vê sorrisos
Pois há quem solevante
Mas quem se entrega para a dor
Acaba ficando ali
o povo objetifica
E a tristeza mortifica

Em um povo desconhecido
tento encontrar o que ali eu perdi
E de tanto vagar
Eu entendi.

Todos tem medo de lembrar,
Mas há os que não querem esquecer
E fazer da dor, o seu poder 

Não é fácil porque
Quem já fez tende fazer
E a gente, procurar
sem nada pra encontrar

A grama em que pisamos já não tem mais cor
A terra rachou
Com sede de amor.

Queria tentar contar meu primeiro assedio de uma forms diferente🎈

12 de maio de 2015

Bolhinhas de sabão

   Sentada na grama do parque procuro assunto que eu possa escrever, me viro no chão e deito de barriga para baixo. Não tem trilha de formigas na terra nem ninguém sentado perto de mim, meus olhos são puxados para cima como imã, e vejo as poucas nuvens que vão se transformando em rostos, objetos ou animais. Algumas se juntam com outras, e algumas preferem ficar sozinhas.
   Mexo e remexo tentado procurar uma posição que não exija minha força, enquanto ouço uma conversa que vem vindo de longe. O parque está vazio hoje, e mesmo assim está difícil escutar quem vem, pois ao lado meus pais também conversam. Cada vez mais próximos consigo identificar a voz de duas mulheres, de costas para elas tento disfarçar.
   Elas conversam sobre uma terceira mulher, que está gravida. Discutem suas opniões a respeito do filho que não podia nascer. Meio perdida começo a ter pensamentos aleatórios.
   Às vezes eu falo sozinha, só às vezes, como hoje de manhã enquanto me trocava. Gosto de banho quente, mas o espelho do banheiro fica todo embaçado e isso me assusta um pouco, porque parece uma nevoazinha de vapor, que me faz por um tempo ficar sem apoio. Minha família sabe brincar de se esconder, e me fazem sempre procurar. O frio de agora me lembra o cheiro do chá que ontem eu tomei. Não dá pra sentar assim. Tô com fome. Mãe? Cadê você? Que horas são mesmo? Ai ai ai ai, uma borboleta.... Que voa muito perto de mim. Melhor eu sair daqui antes que alguém veja o pânico que passo em frente à um ser que devia ser inocente. 
   De repente uma de bolinha de sabão cai sobre mim, olho ao redor...
   Encolho as pernas aos peitos e solto a cabeça para trás. Mais e mais bolhinhas. Fico contente por tê-las. Deito no colo que a grama oferece, algumas queriam ir mais alto, enfraqueciam e estouravam. Outras gostavam de companhia, ficavam juntinhas e tinham todo tempo só delas. 
   Ali estava diferente, a grama era mais escura e o céu mais brilhante. Era a falta de me deitar sobre opiniões diferentes. As bolhas me rodeavam e eu via o reflexo em roxo, rosa e azul. Refletiam o parque inteiro, amenizavam a minha dor provocando meu sorriso, carregavam dentro de si o amor que nas gramas cairia ao desfazerem-se no ar.  

7 de abril de 2015

Aquela outra criatura que vejo no espelho

   Era uma tarde dessas que eu chego em casa e logo entro no meu quarto com a cabeça pesada, virada para baixo.
   Sento na cadeira em frente ao meu armazenamento de descarga de sentimentos pro papel - onde a madeira que o sustenta tem absorvido cada lágrima de risada, pois as tristes evaporam com o tempo.  Me olho no espelho do armário, volto a cabeça para algum ponto fixo qualquer que acho em minha escrivaninha. Em um milésimo de segundo meus olhos são, quase que involuntariamente, virados para o meu reflexo.
   A cabeça segue na mesma direção e por fim o corpo gira sobre as rodas da cadeira até que fico de frente à segunda personagem.
   Conto os defeitos que encontro todos os dias, só aqueles que me incomodam, verifico se não tem algum faltando. Se falta, é uma coisa boa. Significa que estou de bom humor e me vejo menos parecida com o que realmente sou, fico feliz. Mas em dias mais sem graça como estes, não enxergo as qualidades.
   Desamarro meus pés do torturante calçado e enrolo minhas meias uma na outra. Piso em um grande bloco de gelo que cobre meu quarto, e com o tempo meus pés se acostumam com o frio.
   A distância entre a cadeira e a minha outra figura é muito distante, quero estar perto e sentir cada detalhe. Ou não. Só pra me sentir mais amigável com aquela criatura. Sento de pernas cruzadas no chão, sempre com a perna esquerda mais em cima da direita. Parada ali por um tempo, me assusto de tanto olhar a mim mesma, me torno irreconhecível aos próprios olhos.
 Engraçado, não sei explicar....
   Igual quando a gente pensa, pensa, pensa, repete, repete e repete mentalmente a mesma palavra por muito tempo e ela acaba ficando sem sentido. 
   Consigo me ver por fora, como estivesse congelado meu corpo e minha alma não mais estivesse presa nele, sem poder movimentar ou toca-lo. Por um tempo parece que está acontecendo de verdade, posso sentir a facada dura e real de saudade de ser aquele "eu". Então me lembro que é só uma sensação ruim. Assim mesmo tenho medo de não conseguir voltar, e uma alma perdida tomar posse da vida que era minha, destrui-la e magoar muita gente ao meu redor. Tomo um suspiro antes de esconder-me novamente em meu corpo, afinal, quem quer voltar da escuridão de onde saiu? Onde guardo os rancores e as dores que tentam gritar através das lágrimas. 
   Um ar limpo banha meu rosto como um carinho de mãe, e acabo a retornar ao meu corpo, minha forma, meu eu.
  Vejo no espelho meu lado intocável, a parte que é escondida mas não deixa de ser minha, estava ali e me olhava com sutileza. Sei que é só meu lado mais fragil e mais tímido, que se contraria, tropeça, chora e ri de tudo o tempo todo, o que precisa de mais cuidado e deve ser enrolado com muitas camadas de plastico bolha.  O lado sensível que deve ser protegido das minhas manias, das minhas loucurinhas e da constante e controladora baixa auto-estima.

16 de março de 2015

Os sonhos de um anjo

  Uma tarde de sábado na melhor parte do ano, o outono; minha estação preferida, onde as coisas costumam se renovar, as folhas das árvores e eu mesma. E com o céu nublado desapoio meus braços da janela e caminho para o corredor, procurando minha irmã que está em silêncio. Onde ela está? Brincando de se esconder?
  A encontro desenhando na mesinha de seu quarto, sentada no chão com inúmeros lápis de cor ao seu redor.
-      O que você está desenhando? Parece um jardim de cabeça pra baixo- digo enquanto analiso o papel.
-      Não, né!? É uma chuva de flores, ela é bem colorida, está vendo?
  Ela aponta para as flores que já pintou. Ouso perguntar a opinião dela.
-      Hum, o que é uma chuva de flores?
-      São as flores que caem do céu, ué.
-      Você já viu uma dessas?
-      Todo mundo já viu, daã! – com ênfase nesse final, ela me faz rir. Tento disfarçar antes que ela fique nervosa por achar que estou tirando sarro. – É mais bonita do que a chuva de água, mas só acontece de vez em quando. 
 E me olha como se eu não conseguisse ver as supostas flores que chovem em minha janela.
-      Me ajuda? O papel é muito grande. 
-      Ajudo.
 Completando a folha de papel com as variadas cores e formas das mais belas flores que podíamos desenhar, ela senta no meu colo e pergunta se eu gosto das flores.
-      Eu seria uma delas.
-    Eu também.
-      E aí, assim que você queria a sua chuva? 
-      Uhum. Essa vai ser você e essa, eu. 
 Ela aponta, exibindo sua alegria pelo trabalho bem realizado.
-      Quais?
-      Essas aqui, ó. São as mais bonitas!
-      Olha, olha! Acho que está chovendo flores para nós!
-      O que?? 
-      Vem, corre!
   Ela me olhou, parou, e então entendeu o que eu queria. Me puxou para sua janela apressada, pediu que abrisse o vidro. E como gostávamos de fazer, sentamos na pontinha da janela antes do começo da grade, e com ela pude ver a as flores que nos choviam. Era o vento que trazia um pouquinho da sensação de chuva e a felicidade que nos amarrava naquele momento parecia não acabar.
Fiquei em silêncio, achei que ela estivesse com sono.
 A observei com cuidado, nossos olhos são caidinhos, assim como os da mamãe. Seu pé é em cada detalhe igual o meu. Nosso amor ocupa o vazio das palavras e quando pensamos em sintonia, posso sentir as flores que crescem em meu estomago saírem da terra e desabrocharem, não tão belas quanto o olhar dela. Seu sorriso provoca o meu. 
 Olhei para a janela que permanecia calada, a levei para o sofá e a deitei sobre meu colo, meu dedos entrelaçavam-se em seus cabelos. De olhos fechados ela me sussurra sonolenta: 
 - Lê, eu te amo.

 Tento me ajeitar para dar-lhe um beijo na cabeça. Entre estar dormindo e acordada, ela me olha desajeitada com a pálpebra pesada. Dorme sobre meus cuidados um anjo disfarçado, em busca da mais bela chuva de flores em seus sonhos. 

Em um céu de alegria

  Deitei ali mesmo. Bem ali onde o céu parecia de mentira, o azul era escuro e as estrelas o salpicavam. Era uma bela noite de lua Nova e não havia como vê-la. O rio tinha a cor de meus olhos e refletia um pouco da leve luz que o céu nos concebia.
   Algumas horas antes, em uma caminhada pela praia, aguardávamos no desaguar do rio com o mar, um homem alto, nascido na Bahia, que nos levaria com seu pequeno barco de passeio para conhecer o rio e o mangue que cercava seus longos braços. Éramos seis no total, o limite de passageiros que o barquinho carregaria. Subimos em nossa embarcação com desejo, como caranguejos a procura do sal da praia, ou piratas em busca do tesouro enterrado. Fomos levados rio a cima, e por um longo tempo apenas observamos o que estava em volta, no silencio das águas que rio trazia. Então paramos para um mergulho. Como se meus ossos sentissem a correnteza fria, desejei não sair dali.
   Com o tempo tudo foi ficando mais bonito, o sol já se punha entre as árvores e arbustos que separavam o azul da água e o azul do céu. E de um tom de céu mais escuro, as estrelas já nos convidavam para ver a dança que se orgulhavam de fazer lá de cima. Com um rio de profundidade muito maior do que qualquer um ali de nós, subi novamente no barco e vi o quão longe já estávamos, nem mais via a praia de qual partimos. Andei sobre as extremidades de madeira que construia o barco, com a delicadeza de não cair dramaticamente sobre as águas que acabara de sair.  
   Resolvemos algum tempo depois, que estava na hora de se despedir do cenário natural que observávamos sem ter certeza da realidade. E ao tentarmos ligar o motor, recebíamos como resposta um grunhido de quem não quer ir embora. Tínhamos um grande problema. 
  Estávamos longe, longe demais da praia. Longe de tudo, no entanto, de ajuda. O mangue fazia do rio estreito, e os pernilongos faziam de mim refém. Sem sinal de celular ou outro meio de comunicação tentávamos remar sem muito a se conformar diante a esperança e força que investíamos.
  Não tínhamos como voltar, esperaríamos pela salvação que parecia cada vez mais um conto de fazer criança dormir.
  As horas passavam e eu não as notava, atenta as mensagens que a lua me sussurrava. E por um instante encontraram sinal e fizeram a ligação de ajuda. Em duas horas nos achariam, e de volta estaríamos.

 Implorei por naquela noite de céu mais belo impossível, permanecêssemos no barco quase que parado, só não, por conta da correnteza que nos levava com tranquilidade. E foi ali, só ali que com os olhos nas estrelas pude perceber como o céu é coberto pelas tais, mas entre tanta beleza descobri um buraco. Era um buraco num céu de alegria. Alegria de meu nome, das estrelas e da gozada situação que me metera. O buraco há ainda de ser preenchido por minha parte, completando assim o céu (ou melhor, a mim), com as diversas estrelas cheias de vida, que caiam lá de cima pedindo colo.

3 de março de 2015

Esconderijo de memórias perdidas

Como vão embora?
   Ver a porta do último quarto do corredor aberta me faz olhar as fotos do mural da minha mãe, pensar pra onde foi a menina que eu era e aqueles sorrisos sincronizados das fotos. 
   Que saudade boa que me dá, como se voltasse no momento em que a foto foi tirada e lembrar dos detalhes da situação. 
    Ou então deitada na cama antes de dormir penso em milhares de erros que já cometi, dos mais discretos aos mais catastróficos. 
   Essas ocasiões costumam me emocionar, mas eu gosto de poder lembrar. Ruim mesmo é a gente perder uma memória, de repente ela não está mais lá. Não é como esquecer a palavra que eu queria usar mas esqueci, ou a matéria de uma prova importante, ou um assunto que estava pensando agora a pouco. É uma coisa dolorida, misturar os detalhes de lembranças antigas que se guardam para te dar saudade mais tarde. 
   Esse esquecimento não é como aquele que volta pra gente como se nunca tivesse sumido, com cara de culpado depois que a gente já não precisa mais dele. Ou aquele que a gente reaprende, e diz “nossa! Eu sabia disso!”. 
   Mas como essas memórias recheadas de emoções se perdem? Que estranho que é, né? Eu gosto de ler sobre curiosidades e pequenas pesquisas, que fazem para responder esses tipos de perguntas que as pessoas costumam se fazer uma vez na vida, mas ainda não achei quem me respondesse.
   Acho que acabamos guardando certas coisas em um poço profundo para que caibam tudo o que queremos (ou não), mas quando esticamos nossos braços pra resgatá-las percebemos que estão longe demais e quase não temos mais ideia do que elas são.
   Ou então a gente só desprezou algumas memórias quando bem pequenos, porque não significavam, não tinham importância. Não tinha importância? Engraçado, talvez não soubéssemos, por volta dos três anos, o que é dar importância ao que acontece em nossas vidas, e pequenezas de dias cotidianos. (Suspeito ainda que não aprendi completamente essa coisa de dar importância a tudo isso, mas esse é outro assunto).
   Existem tantos “talvez” que eu queria escrever aqui tentando responder a mim mesma, tantas discussões que já tentei formular, mas ainda não pensei em nada concreto. 
   Será que a gente esquece por completo? 
   Que difícil que é pensar assim, não podemos só perder as lembranças e fim?
   Sem mais nada pra pensar, lembro que gostava de deitar de cabeça para baixo no sofá e gargalhava porque não aguentava muito tempo.

   E se for possível relembrar memórias perdidas? O que eu estou fazendo aqui escrevendo sobre as lembranças apagadas, com uma borracha já velha e usada, permitindo-me ver os resquícios de uma  Lê mais nova, que ainda não se preocupava com o futuro?