Uma tarde de sábado na
melhor parte do ano, o outono; minha estação preferida, onde as coisas costumam
se renovar, as folhas das árvores e eu mesma. E com o céu nublado desapoio meus
braços da janela e caminho para o corredor, procurando minha irmã que está em
silêncio. Onde ela está? Brincando de se esconder?
A encontro desenhando na mesinha de seu
quarto, sentada no chão com inúmeros lápis de cor ao seu redor.
- O que você
está desenhando? Parece um jardim de cabeça pra baixo- digo enquanto analiso o
papel.
- Não, né!? É
uma chuva de flores, ela é bem colorida, está vendo?
Ela aponta para as flores que
já pintou. Ouso perguntar a opinião dela.
- Hum, o que
é uma chuva de flores?
- São as
flores que caem do céu, ué.
- Você já viu
uma dessas?
- Todo mundo
já viu, daã! – com ênfase nesse final, ela me faz rir. Tento disfarçar antes
que ela fique nervosa por achar que estou tirando sarro. – É mais bonita do que
a chuva de água, mas só acontece de vez em quando.
E me olha como se eu não conseguisse ver
as supostas flores que chovem em minha janela.
- Me ajuda? O
papel é muito grande.
- Ajudo.
Completando a folha de papel com as
variadas cores e formas das mais belas flores que podíamos desenhar, ela senta
no meu colo e pergunta se eu gosto das flores.
- Eu seria
uma delas.
- Eu também.
- E aí, assim
que você queria a sua chuva?
- Uhum. Essa
vai ser você e essa, eu.
Ela aponta, exibindo sua alegria pelo
trabalho bem realizado.
- Quais?
- Essas aqui,
ó. São as mais bonitas!
- Olha, olha!
Acho que está chovendo flores para nós!
- O
que??
- Vem, corre!
Ela me olhou, parou, e então
entendeu o que eu queria. Me puxou para sua janela apressada, pediu que abrisse
o vidro. E como gostávamos de fazer, sentamos na pontinha da janela antes do
começo da grade, e com ela pude ver a as flores que nos choviam. Era o vento
que trazia um pouquinho da sensação de chuva e a felicidade que nos amarrava naquele
momento parecia não acabar.
Fiquei em silêncio, achei que ela estivesse com
sono.
A observei com cuidado, nossos olhos são
caidinhos, assim como os da mamãe. Seu pé é em cada detalhe igual o meu. Nosso
amor ocupa o vazio das palavras e quando pensamos em sintonia, posso sentir as
flores que crescem em meu estomago saírem da terra e desabrocharem, não tão
belas quanto o olhar dela. Seu sorriso provoca o meu.
Olhei para a janela que permanecia calada,
a levei para o sofá e a deitei sobre meu colo, meu dedos entrelaçavam-se em
seus cabelos. De olhos fechados ela me sussurra sonolenta:
- Lê, eu te amo.
Tento me ajeitar para dar-lhe um beijo na
cabeça. Entre estar dormindo e acordada, ela me olha desajeitada com a pálpebra
pesada. Dorme sobre meus cuidados um anjo disfarçado, em busca da mais bela
chuva de flores em seus sonhos.
Muito bonito mesmo, viu Leê!
ResponderExcluirLinda crônica, Letícia! Fiquei emocionada, pensando como vai ser legal um dia vocês lerem essa crônica juntas, já adultas e crescidas. Note como o texto vai ganhando ritmo e corpo, à medida em que você vai contando a história.
ResponderExcluirBom trabalho!
Luana
Letícia, quanta sensibilidade, texto lindo, cheio de amor.
ResponderExcluirParabéns
beijos
Carla
Ola, Leticia! Sou Flavia Carvalho, amiga da sua mãe e do seu pai. Li seu texto e adorei! Você escreve muito bem e com muita sensibilidade. Vou ler para minha filhinha, a Luisa, certamente ela vai gostar muito! Beijinhos.
ResponderExcluirTexto muito inspirado e inspirador, cara Letícia. Principalmente vindo de uma menina, e ainda mais nestes tempos em que parece haver pouco espaço para a poesia, para a humanidade e para o amor. Parabéns!!! Postagens como esta, vindas dos jovens, nos fazem acreditar que nem tudo está perdido e ainda vale muito à pena lutar por tempos melhores e mais humanos. Beijo. Altamir.
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